sexta-feira, 14 de setembro de 2018

"A Mala Vermelha" - Cap 13 (3ª parte)





Acordaram com a cauda de Filipe a bater-lhes como um chicote duro e implacável, era hora de “ir à rua”, e alguém teria de o levar.
- Vai lá tu, o cão é teu… - gozou João, aconchegando-se no édredon.
- Pago-te o almoço. – brincou Marta sem sequer abrir os olhos. Era demasiado cedo para carregar um cão daquele tamanho ao colo.
- Só lá vou se desistires da ideia de conduzir o meu carro. – provocou-a sorrindo para a almofada.
- Deixa estar. Eu levo-o. – disse-lhe a começar a levantar-se – Eu quero muito saber como é conduzir a 200 à hora! – gozou, sendo lançada novamente para a cama, no meio de uma luta encenada.
João aproveitou o momento, prendendo-a com o peso do seu corpo contra a cama e beijando-a com paixão, sendo automaticamente correspondido com a mesma violência. Beijaram-se durante bastante tempo, ora acalmando e olhando um para o outro, ora lançando-se naquela espiral de loucura que só terminaria sem roupa. Marta dava o ritmo, puxando-o para a realidade atrasando a intensidade dele, ou dando-lhe estímulos que o enlouqueciam, sem conseguir contrariá-la.
- Lição número um… o beijo tântrico. – sussurrou-lhe ao ouvido, empurrando-o lentamente de cima do seu corpo.
- Vamos Boby, vamos à rua respirar ar puro… - disse João vestindo-se e olhando Marta divertido. – A tua dona é uma professora perversa e mal intencionada. – pegou no cão e Marta beijou-o novamente com paixão, amolecendo-o instantaneamente, o que o fez quase deixar cair Filipe dos braços.
- Já lá vou ter. Vai pedindo o pequeno almoço, por favor. – disse-lhe, sorrindo maliciosamente e fechando a porta do quarto devagar.



- Não atendes o telefone? – rosnou Tiago enfurecido com a ideia de que Marta não tivesse dormido em casa. Observa-lhe os movimentos na última semana, como habitualmente, e assim que vira o tipo a rondar a casa percebeu que ia ter chatices. Tornou a marcar o número de casa dela e bateu furiosamente com o auscultador na mesa, libertando a ira dos ciúmes. – Eu disse-te que tu eras minha, não percebes a bem, percebes a mal. – vociferou, acendendo outro cigarro.


Sentaram-se no terraço do hotel, esfomeados, depois de um jejum forçado no dia anterior, com Filipe deitado aos seus pés, já de barriga cheia. O funcionário da receção trouxera-lhe uma taça de ração e água antes de Marta aparecer de túnica semi-transparente e fato de banho por baixo, provocando espanto nos três machos. João olhara com desagrado para o rapaz, que se afastou atabalhoadamente, perturbado pela visão sempre sugestiva de roupa transparente.
- Não tinhas nada mais discreto para vestir? – perguntou-lhe sorrindo para dentro do decote, quando a ajudou a sentar, cavalheiresco.
- Isto é absolutamente próprio para passar o dia à beira da piscina. – explicou, colocando as pernas à chinês, despreocupada com a transparência da roupa. – Acho que já vimos beleza natural que chegue.
- Não quero mais ser teu irmão. – brincou, pegando-lhe na mão e beijando-lhe o pulso na parte de dentro, o que provocou um arrepio visível nos braços de Marta. – Também já li o livro, esqueceste-te?
O funcionário mantinha-se de pé corado, de ementa na mão, sem coragem para olhar a cena incestuosa matinal.
- Então, já decidiram o que vai ser? – gaguejou com a garganta seca.
- Sim, - respondeu Marta sorridente – Chá de menta para os dois, ovos mexidos aqui para o mano, torradas para mim e… ah, e geleia de morango. Obrigada. – disse decidida sem retirar a mão poisada no antebraço de João, que por sua vez não conseguia tirar os olhos dela, sem ligar ao empregado.
- Sim, senhora. – disse o rapaz, engolindo em seco e retirando-se o mais rápido que conseguiu.
- O mano está curioso, porquê chá de menta? E ovos mexidos? Nunca comi ovos ao pequeno-almoço, nem no estrangeiro, isso é muito forte. – comentou apreciando a descontração dela tão bem integrada no ambiente chique de todo o espaço. Compreendia agora que antes de se ter mudado para Coimbra, Marta nunca tinha vivido de outra forma, rodeada de empregados e salamaleques, guardanapos no colo e copos de vários tamanhos.
- Chá de menta para te pôr alerta, ovos, para te dar força. – piscou-lhe o olho, subindo a mão até ao ombro de João, massajando-o.
- Mais alerta ainda? – gracejou, dando um gole na água fresca, e suspirando.
- Precisava de praticar um pouco, desde anteontem que não faço yoga, sinto-me a emperrar… - desconversou divertida, passando a massagem do ombro para a palma da mão, sem quebrar o toque, mantendo-o sempre concentrado nela.
- Eu também precisava de praticar, e se não paras quieta um momento, é aqui mesmo. – resmungou, estimulado continuamente pela mão experiente de Marta.
- Não querias sexo Tântrico? Já estamos a praticar desde que acordámos. – disse com naturalidade.
- E quanto tempo é que isto vai durar? – perguntou-lhe genuinamente aflito com a ideia de estar um dia inteiro em “alerta”, chegando-se a ela para manter a conversa mais privada.
- Depende do objetivo. – respondeu-lhe bem perto da cara – Não leste a parte teórica! – ralhou, beijando-o de seguida.
Terminaram o beijo escaldante e demorado e aperceberam-se de que o funcionário já havia colocado a refeição na mesa, com todos os preceitos, e desaparecido depois.
Olharam a mesa maravilhados com o aspeto do comer, e lançaram-se sem mais conversas, apenas interrompidos pelos beijos ocasionais que Marta exigia, limpando os lábios com o guardanapo com elegância e puxando João na sua direção.
Acabaram a refeição e levaram Filipe para junto da piscina, onde se mantiveram colados, da forma mais decente que conseguiam em público, parando para mergulhar, praticar algumas Asanas, Pranayama e mais beijos escaldantes.
João aprendeu novos exercícios de respiração que Marta achava vitais que praticasse diariamente, para prevenir outros ataques de pânico; recusava-se a aceitar que ele, um Psiquiatra, não conseguisse dominar o seu corpo sem drogas. Falava de forma tão natural sobre o problema de ansiedade que parecia ser a médica, e ele o paciente. João suspeitou a dada altura que aquilo não fosse uma completa novidade para ela, tão certa que estava de que, assim que ele compreendesse o que disparava o seu corpo naquela defesa emocional, tudo ficaria resolvido.
- Tens a certeza de que não és médica? – perguntou-lhe desconfiado com tanta sabedoria, talvez ela tivesse vivido aquele tipo de problemas com o ex-marido, concluiu.
- Não, Sr Dr., não sou. Apenas tive uma pessoa na família que sofria do mesmo problema, e curou-se. Agora faz o que te estou a dizer, preguiçoso. – explicou, obrigando-o a concentrar-se no fluxo da sua respiração.
- Já almoçámos, já lanchámos, já fui estimulado em todos os sítios possíveis e imaginários, e confesso que não sabia que no pé podia haver tanta comichão boa, - confessou a sorrir com malícia – afinal, quando é que vamos arrumar as malas ao quarto?
- Se me permites, sugiro-te que “arrumemos as malas” em minha casa. Tenho paranóia com camas de hotel. – disse corando – Preferia estar no meu habitat natural. – pediu constrangida.
- Isso significa que vais até Coimbra a massajar-me as orelhas? – exclamou em pânico, imaginando a viagem terrível que seria estar duas horas a conduzir com ela a mexer-lhe com os nervos.
- Bem, se for eu a conduzir, não. – disse-lhe sorrindo de orelha a orelha.
- És uma sabida. A tua sorte é que te adoro. – confessou naturalmente, sem se aperceber. Beijou-a e levantou-a do chão, sem perceber o seu ar chocado com a declaração amorosa que lhe saíra da boca, pegando em Filipe e dirigindo-se para o quarto. Estava a ficar tarde e tinham ainda muitos quilómetros pela frente, e se ela fosse a conduzir teriam de ser feitos com calma, pensou nervoso.
Passavam pelo balcão da receção e Marta não pôde deixar de parar para falar com o rapaz simpático que os tinha aturado durante aqueles dois dias.
- Estamos quase a ir embora, obrigada por tudo. – Inclinou-se e deu-lhe dois beijos – Nós não somos irmãos. – sussurrou-lhe, piscando-lhe o olho e deixando-o corado a sorrir de alívio.


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