Despiu-se rapidamente e exibiu
orgulhoso toda a sua excitação ao espelho, sentindo-se bem animado
com a vida, pela primeira vez há muito tempo. Uma leve culpa de
estar a trair a namorada tentava entrar na sua cabeça, mas João não
se sentia minimamente ligado à mulher que batia portas na cozinha.
No fundo, e para sua desculpa interna, ele nem a conhecia. Mas a
Ganesha era diferente, trazia-lhe uma sensação de paixão que o
fazia querer ser solteiro, livre e desimpedido. Não podia ser
coincidência. Se ele tinha uma amante hindú teria de haver
um motivo muito forte, e a Isabel tinha de ter defeitos que o
levassem a olhar para outra, dizia a si mesmo. Entrou no banho,
sempre de olho no telefone, tornou a imaginar aquele corpo junto ao
seu, tão sedoso, a escorregar facilmente no seu, a espuma a cair
devagar pelas curvas suaves, a beijar-lhe as nádegas... o telemóvel
apitou e João tirou o sabão rapidamente, secando-se a seguir
atabalhoadamente, só o suficiente para não estragar o telefone. "Se
pedes assim, com tanta educação... Já estás em casa?" um
arrepio fez-lhe regressar a excitação, será que ela iria propor aparecer-lhe ali...? em sua casa? Teria de encontrar uma forma de se
livrar da namorada, disse a si mesmo decidido. "Estou. Estive a
tomar banho,... e acho que eras tu que me estavas a esfregar as
costas..." riu-se com a sua ousadia. Saiu para o quarto em busca
de uma roupa lavada, sempre sem tirar o sorriso do rosto, abriu todas
as gavetas que lhe pareciam um local coerente para arrumar boxers,
vestiu a roupa interior e continuou a abrir portas e gavetas, sem
saber bem o que vestir, confuso com tanto fato e tão pouca coisa
prática para andar por casa. Uma gaveta resistia em abrir, e João
precisou usar de toda a perícia dos dedos para desentalar o que lhe
parecia ser um livro a trancar a abertura, abrindo-a com esforço.
Pegou no livro, bastante curioso, achava aquele um sítio bizarro
para guardar literatura, junto às camisolas de inverno, ficando meio
perplexo a ler a capa "Sexo Tântrico"... abriu-o e algo em
si estremeceu ao ler escrito a lápis "Marta 2012". Já era
a segunda Marta que lhe surgia na sua recente vida consciente, não
poderiam ser a mesma, com toda a certeza, pensava confuso. Um quebra
cabeças complicava-se a cada dia que passava, havia uma Isabel, uma
Ganesha, uma Marta enfermeira e uma Marta que lhe emprestara aquele
livro. Outra mensagem surgia no telemóvel poisado em cima da cama, e
João sentou-se com o livro numa das mãos e o telefone noutra, cada
vez mais intrigado com aqueles factos novos. "Quando saíres do
banho vai até à estante embutida do lado esquerdo. Na prateleira
mais alta, ao fundo, encontras-me." Deu um salto automático,
como se fosse aquela uma ordem inquestionável, percorreu a
prateleira com a mão e algo duro e frio lhe surgiu bem ao fundo,
como se ali tivesse sido colocado propositadamente escondido do campo
de visão. Pegou-lhe e deixou-se ficar uns segundos a olhar a pequena
estátua de um elefante cheio de braços, uma mistura de fofice com
excentricidade, uma imagem que já tinha visto quando fez a pesquisa
da palavra "ganesha" na internet. Teria sido ela a colocar
ali a estátua? A ideia de que já ali tinha andado no seu quarto
aquela mulher misteriosa era tão excitante que tornou a fechar-se na
casa de banho para continuar a conversa. Pensou no que lhe haveria de
dizer... tinha tantas perguntas que seria difícil escolher uma. "Já
aqui estás na minha mão... O que queres de mim?" Engoliu em
seco e poisou a imagem no lavatório, desfolhando o livro que lhe
parecia um ótimo prenúncio para toda aquela realidade hindú que
surgia na sua vida. Posições e teorias sobre como prolongar
orgasmos, durante horas!, constatou maravilhado, parecia o sonho de
qualquer um, se com a mulher das pernas bonitas, claro. Já tinha
pensado várias vezes como faria para lidar com a intimidade com a
namorada, que mesmo bonita e sexy não lhe parecia nada o seu género
de mulher. Não que lhe parecesse um castigo, afinal já há muito
tempo que estava sem sexo, segundo a lógica, mas tinha-se apanhado
diversas noites a matutar nessa questão. Os beijos ocasionais que
Isabel lhe dava não o faziam sentir nada de especial, e para ser
sincero consigo mesmo a massagem da enfermeira Marta tinha-o
arrepiado mais... Mas talvez estivesse na hora de perceber se a
namorada o conseguiria fazer esquecer a amante, pensou decidido. Iria
aproveitar aquela excitação que sentia para tirar as suas dúvidas.
Saiu da casa de banho e deixou tudo espalhado pelo quarto, tinha um
objetivo em mente e teria de se despachar antes que lhe passasse o
rancor. Entrou pela sala e abraçou Isabel, que se sobressaltou com
aquela abordagem tão atípica.
- Sabes o que gostava de experimentar?
- disse-lhe ao ouvido.
- Bem, acho que consigo adivinhar...
mas assim? Antes de comer? - reagiu confusa e ligeiramente
contrariada.
- O almoço ainda deve demorar a
chegar... - sussurrou antes de a beijar.
Nélia correspondeu o beijo o mais
naturalmente possível, pensado em mil e uma formas de conseguir
safar-se daquela. Não esperava nada ter de começar logo naquele dia
as funções de namorada. - João, ainda estás fraco.... - ronronou
tentando libertar-se dele suavemente.
- Eu aguento. - puxou-a por um braço
e encaminhou-a ao quarto, sentando-se na borda da cama e apertando-a
contra si. - Tens de me mostrar como é que antigamente fazíamos
isto. - desafiou-a sorrindo.
- Ok, mas rápido. - disse secamente,
sorrindo de volta contrariada. Deitou-o para trás e dedicou-se o
mais que conseguiu a fingir excitação, representar papéis sempre
tinha sido uma das suas atividades favoritas, mas aquele era difícil,
ainda não se esquecera da humilhação que passara naquele quarto há
algum tempo atrás. Continuou a sua cena de casal apaixonado, e
sentia-o já bem dominado, aquilo seria mais rápido, constatou
aliviada. Tirou a camisola e usou de todos os seus atributos para o
enlouquecer, resultava sempre, olhando em volta indolentemente. Viu
bem perto da cabeça dele o telemóvel a vibrar, aproximou-se do
aparelho, certificando-se de que João estava distraído e abriu a
mensagem que tinha chegado. "Quero que voltes para mim...
procura-me" Uma raiva apoderou-se dela, cegando-a, num ciúme
azedo que lhe invadiu a garganta. O nojento tinha estado escondido às
mensagens com outra e agora aliviava-se nela... novamente usada como
uma puta, pensou amargurada, enquanto João lhe despia as calças e a
roupa interior. Carregou no botão de chamada e colocou o telemóvel
novamente na cama, agora era esperar a sonsa atender e estava
resolvida a questão. - João... agora, agora! - gemeu Nélia,
fingindo-se a enlouquecer de prazer, caprichando nos sons. João
obedeceu-lhe e fizeram amor como se não houvesse amanhã, sem
inibições de qualquer espécie, levados pelo calor do momento. -
Diz o meu nome! - gritou Nélia acelerando o ritmo dos dois
propositadamente, já consciente de que a chamada estava a ser ouvida
há alguns segundos. - Isabel... - sussurrou meio a contragosto. -
Mais alto! - grunhiu alternado com sons de prazer teatralizados –
Isabel!
Janota entrou na sala e sentou-se no
cadeirão em frente a Isabel que chorava silenciosamente no sofá.
Não sabia bem o que dizer, mas suspeitava que o motivo teria o nome
de João. Isabel colocou o telemóvel na mesinha no meio dos dois e
olhou para o chão sem conseguir encarar o amigo. Janota estendeu-lhe
a mão e puxou-a suavemente para si. Queria consolá-la, tirar-lhe
aquela dor do peito, aquele homem do coração. Sentou-a no seu colo
e deixou-a chorar, sem dizer nada. Estaria sempre ali para a ajudar.
(direitos reservados, afsr)
(imagem, internet)
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