Nuno fumava um cigarro na
varanda, de costas para o seu pesadelo constante, a falar ao telefone com Sofia
que fazia uma birra para conseguir que o tio
a autorizasse a dormir em casa da melhor amiga. O instinto protetor do tio limitava a adolescente a saídas monitorizadas e
agora Sofia, com 15 anos, começava a exigir liberdade, o que o perturbava.
Margarida sorria divertida com a conversa vinda do exterior, gozando a falta de
experiência de Nuno no que dizia respeito a miúdas com as hormonas aos saltos.
A menina que idolatrava o tio
jeitoso começava a olhar para outros marmanjos, e ele tinha de aceitar isso,
era inevitável. Quando tivesse oportunidade iria dar-lhe umas dicas sobre o
assunto, pensou, distraindo a mente dos raciocínios mais sérios que estivera a
fazer nas últimas horas. A vida era assim, divagava ela, mesmo perante a
tragédia que nos paralisa por momentos, a natureza exige a continuidade, e as
meninas ficam doidas com os meninos, e vice-versa, e Nuno tinha de se pôr a pau
e abrir os olhos!
- Bem, parece que para algumas
mulheres a minha companhia é perfeitamente dispensável - lamentou ele frustrado
- a Sofia vai dormir a casa da sua BFF, citando a própria - esclareceu - e eu
fiquei com a noite livre! Podíamos ir jantar qualquer coisa junto ao rio, adoro
a comida no Itália! - convidou ele animado.
- Mas tu não tens mais amigos?
- questio nou ela em voz alta, e
lembrou-se que tinha de se acautelar para não verbalizar tudo o que lhe vinha à
cabeça - Não precisas de te sentir obrigado a fazer-me companhia, eu estou
habituada a estar sozinha, e até gosto. - justificou ela.
- Tenho muitos amigos,
obrigado. Sou uma pessoa adorável e de quem é fácil se gostar. - escarneceu ele
- Mas se preferes ficar sozinha em casa a olhar as paredes do quarto, em vez de
comer pizza e dar migalhas de pão aos patinhos do rio, o problema é teu! -
gozou ele.
- Ok, vamos lá engordar esses
parasitas do Mondego! - e fingiu não perceber a alegria dele, mantendo o seu
estilo “enfadada de quem está a fazer um frete”. Saíram do escritório e
Margarida trancou a porta guardando a chave na carteira. Dirigiam-se ao
exterior do prédio e ao passarem pelos corredores das pequenas secretárias,
Margarida começou a perceber que os olhares dos colegas estavam carregados de
insinuações sobre ela e o gigante, e pensou que talvez fosse bom assim,
pensarem que eram um casal, isso distrairia a multidão da investigação que corria
na sala do fundo. Iria conversar com Nuno sobre essa possibilidade.
Ao virar a esquina do corredor,
Catarina surgiu distraída e demasiado apressada, embatendo contra a parede de
músculos que educadamente se apressou em amparar-lhe a queda, e Margarida ficou
com a suspeita de que esta tinha sido uma cena teatral estudada pela nova
funcionária. A tipa era esperta! E
estava definitivamente na lista das que se voluntariavam para se
"colocarem debaixo dele", como lhe tinha sido explicado
anteriormente.
- Peço desculpa, magoei-o? -
disse ela desgrenhada e com um ar pouco convincente de inocência. Margarida
revirou os olhos de nojo e não fez qualquer esforço em disfarçar a sua
repugnância pelos modos assanhados da rapariga.
- Não há problema, mas para a
próxima tem de ter mais cuidado, se tivesse ido contra a minha colega não lhe
garanto que saísse inteira! - e riu satisfeito ao ver a expressão de dúvida e
receio que provocou na pequena desmiolada, que se endireitava e compunha os
cabelos.
Margarida avançou para a porta
furiosa com vontade de lhe mostrar ali mesmo como poderia ser bruta se a
provocassem.
Ele seguiu-a apressando o passo
para a alcançar.
- Ei, espera aí! Estava só a
brincar com ela! – confessou divertido - Tens de ser sempre tão séria? -
lamentou frustrado, agarrando-lhe um braço com dificuldade.
- Para a próxima limita-te a
apanhar as parvinhas do chão e não me incluas nos teus jogos de sedução.
Esclarecido? - aquilo era demais para Margarida, odiava aquelas fulanas
dissimuladas que usavam todas as mesmas técnicas patéticas para chamar a
atenção de um macho. Bahhh
- Vou-te buscar às 20h00, e não
te esqueças do saquinho com os restos de pão. - gracejou ele - Os pobres
animais indefesos não têm culpa dos teus ciúmes! - e antes que ela pudesse
reagir, enfiou-se no jipe, deixando-a colérica e abandonada no meio da rua.
(direitos reservados, afsr)
(imagem, internet)
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