Final
Jaime observava os trabalhos dos
Bombeiros, o fogo estava quase extinto. Escorria uma água negra por toda a
estrada, que simbolizava na perfeição o que sentia desde o momento em que vira
a explosão, dor, escuridão, vazio. O esqueleto do jipe denunciava que Nuno
tinha lutado, não havia um pedaço de ferro direito. Tentou recriar a cena,
distraindo o coração do facto de naquele dia a vítima ser um amigo. Os dois
polícias tinham entrado na ponte pela margem norte, embateram nos rails quase
até ao outro lado, fizeram um pião, tornaram a percorrer a plataforma
encostados aos separadores e explodiram. Os outros pormenores seriam
encontrados, assim que a polícia pudesse chegar perto do jipe. Jaime teria de o
fazer também, tinha caminhado até meio da distância que o separava do fogo, mas
as pernas estavam presas, não colaboravam. Temia a certeza do fim, teria de
anunciar a desgraça aos familiares, seria o porta-voz da morte de Nuno. Engoliu
em seco, deu um passo em frente, estacou novamente.
- Ana… isto não pode estar a
acontecer, não outra vez… - gemia Jorge, perdido no desespero.
A mulher não fora capaz de
verbalizar; dedicara as poucas forças a abraça-lo, amparando-lhe a dor. Havia
momentos na vida em que tudo o que pudesse ser dito, era heresia.
Tinham deitado Margarida no quarto
principal da casa, deixando-a recuperar do desmaio, evitando por alguns
momentos o pesadelo de partilhar aquela notícia lúgubre. As crianças da casa
estavam remetidas à sala, onde esperavam impacientes por algum adulto que lhes
explicasse o que se estava a passar. O silêncio do apartamento era um mau
presságio, pensavam angustiadas.
- É preciso ter a certeza do que se
passou… - choramingou Ana, ganhando forças para dominar a situação de forma
prática – não vamos dizer que … ele morreu sem que o Jaime nos telefone. –
concluiu.
- Eu ouvi Ana, aquilo explodiu! –
vociferou descontrolado – Que raio é que tu achas que aconteceu? Um Milagre?? –
Jorge dirigia a raiva para a pessoa que sabia que nunca o abandonaria.
- Proíbo-te de abrires a boca antes
de ele telefonar! – Ana enfrentava-o, temia a reação de Margarida, era
necessário algum bom senso naquele momento dramático, e o marido seria brutal,
sem piedade.
- Proíbe-o de dizer o quê? –
Margarida olhava-os, receosa de alguma má notícia. Esperava abrir os olhos e
vê-lo, como acontecera noutras ocasiões, mas estava só no quarto.
- Querida, já acordaste? Como te
sentes? – Ana dirigia a conversa para outro tema, tentando ganhar tempo.
- Estou bem, acho… mas o que se
passou? Onde está o Nuno? Encontraram-nos? – O nervosismo atacava-lhe todos os
poros do seu corpo, fazendo-a suar.
- Margarida, o Nuno… - Jorge queria
acabar com aquele suspense, as palavras queriam sair, libertando-o daquele
segredo horrível.
- O Nuno quer casar contigo.
Aceitas? – a voz de Nuno surgiu inesperadamente, deixando-os a todos
petrificados quando o viram entrar na divisão, ensanguentado, roto e negro.
- Filho da mãe!!! Está vivo!! –
Jorge gritou avançando na direção do irmão, em êxtase.
- Mas porque carga de água é que
havia de estar morto? – brincou – Não é uma explosãozita que me mata! – tentava
libertar-se do irmão que o abraçava como uma lapa.
Ana sentou-se com violência na
cadeira mais próxima, empalidecida, em choque, eram emoções a mais para uma
mulher a entrar na menopausa, pensava aliviada.
- Podes largar-me?? – Nuno
debatia-se com os braços grossos e fortes de Jorge.
Margarida olhava-o, de pé, sem se
mexer, em transe. Explosão? Morte? Estava vivo? Casamento? Via luzinhas a
querer anunciar mais um desmaio, mantinha-se forte para não cair.
- Filho da mãe!!! – berrava Jorge no
seu desvario de alegria, enquanto largava Nuno relutantemente. Não se
apercebera das intenções do irmão, nem ouvira o pedido de casamento tão pouco,
só o vira ali, vivo, e mais nada.
- E então? Aceitas? – Nuno
colocou-se diante de Margarida, que o fitava de cabeça erguida para conseguir
chegar ao nível dos seus olhos.
- Aceito o quê? – estava
aparvalhada, tal como Jorge.
- Aceitas casar comigo? – Nuno
deu-lhe as mãos – Não digas que não, olha que eu sou um ótimo partido! –
brincou.
- Casar? – continuava em choque, com
a cabeça a girar, não podia perder os sentidos naquele momento, suplicava a si
mesma. – Sim.
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(imagem, internet)
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