quarta-feira, 2 de maio de 2018

"A Mala Vermelha" - Cap 7 (2ª parte)




Despediram-se já a tarde ia a meio, depois do efeito do álcool estabilizar para conseguirem conduzir sem problemas, e Marta ofereceu-se para um dia ajudar Janota a resolver o problema de costas que o massacrava há alguns meses, deixando João incomodado e mordido de ciúmes. Entraram os dois no jipe, seguidos por Filipe, que se acomodou no banco traseiro, estrategicamente no meio, para os observar com curiosidade. Olhava um e outro alternadamente, à espera, de orelhas em pé.
- Gostei muito dos teus amigos. – iniciou Marta, tentando quebrar o gelo que se sentia dentro do pequeno veículo.
- Hum… - João olhava a janela amuado, sentia-se péssimo, irritado, excitado, ciumento, e de mãos e pés atados, sem possibilidade de resolver o seu problema.
- Desta semana a oito vou combinar com o Janota e dar-lhe umas massagens… e já agora, porque é que lhe chamam esse nome tão ridículo? Não fazes ideia de como ele tem aquelas vértebras… Tudo torto. – continuou descontraída e ocupada com a condução.
- Foi o Salvador que lhe deu a alcunha, já não sei porquê. – respondeu secamente, esforçando-se por não a olhar.
- O que tens? – questionou-o admirada com tanto silêncio.
- Nada. – disse secamente.
- Ok. – decidiu calar-se e conduzir até casa. Sabia perfeitamente porque ele estava amuado. Aquela situação começava a tornar-se impraticável e insustentável. Talvez visitasse os pais mais cedo do que tinha previsto. Seria bom para os dois uns dias de afastamento, pois mesmo que doloroso, que tinha a certeza que seria, era necessário. – Amanhã vou visitar os meus pais a Castelo Branco, fico por lá uns dias, ainda não sei se volto antes do fim de semana. – informou-o tentando não transparecer na voz nenhuma altivez ou desdém, o que o deixaria irritado.
- Porquê? – perguntou chocado com aquela ideia de estar sem a ver uma semana inteira.
- Porque tenho de os ver, e a viagem é longa e cansativa, não gosto de ir e vir de repente. – esclareceu.
- Mas… não estás cá nem na sexta feira? – perguntou quase em súplica, sentindo-se agoniado.
- Bem… - recordou-se do aniversário dele – Vou tentar, mas não prometo.
- Ok, tu é que sabes. – o jipe parou naquele momento junto do carro dele, estacionado num local fresco e seguro, e João saiu com vontade de bater a porta com força. Respirou fundo, deu meia volta ao jipe e colocou-se inclinado na janela do condutor, sorrindo-lhe com esforço. – Desculpa, às vezes sou meio estúpido. Quando voltares diz qualquer coisa, faz boa viagem. - beijou-lhe a cara, demoradamente, deixando-a derretida no banco, sem forças para reagir e disse adeus ao cão, acenando-lhe. – Adeus Filipe, até pra semana. Toma bem conta dela.
O cão ficou em sonoros lamentos a olhá-lo a dirigir-se para o carrão desportivo, mexendo-se freneticamente no banco.
- Para com isso! – ralhou Marta, com os olhos rasos de água. – Machos estúpidos, devia ter ficado com uma cadela! Ou se calhar era pior, também se apaixonava por ele, e podia facilmente lambê-lo quando quisesse, e depois tinha de a matar! – berrou dizendo coisas sem nexo, a expulsar a tristeza e a raiva de dentro de si, enquanto fazia de carro o restante caminho até casa, bem devagar. Mas porque tinha a vida dela de ser tão cínica e maldosa, lamentava-se a sentir-se miserável e cheia de autocomiseração.



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