Margarida assumiu novamente o
discurso, reagindo da única forma que sabia, o cinismo como mecanismo de
defesa,
- E já que estamos aqui os dois
a partilhar características pessoais, mas até agora só me disse o que descobriu
sobre mim, quer que use os meus super poderes para o descrever, ou tem medo do
que pode ouvir? É que hoje estou particularmente generosa, e os meus honorários
estão com desconto de 50%, por isso é de aproveitar! – disse friamente.
Tomás chegou-se para a frente,
ganhando terreno naquele confronto inesperado, e mostrando que ali era ele o
Alfa. Margarida recostou-se instintivamente, o que lhe pareceu agradar ao testerónico invasor da sua paz de
espírito.
- Não pense que é fácil para mim
vir aqui tentar convencê-la a ajudar-me, nem sei bem como, mas garantiram-me
que o conseguirá fazer. Devia começar a ouvir e confiar nas outras pessoas,
aprende-se bastante quando não conversamos apenas com as vozinhas da nossa
cabeça! - gozou ele, retomando a descontração física de quem dominou qualquer
coisa. - É preciso coragem para pedir
favores a estranhos, mas na minha profissão não há lugar para maricas. – e
continuou sem dar tempo de resposta - O meu nome é Nuno, obviamente que já
tinha desconfiado que não tinha utilizado o nome verdadeiro. Se bem a conheço -
e parecia mesmo conhecer, pensou ela - teria feito uma investigação informática
com base nessa informação, e eu precisava mesmo de a apanhar desprevenida, para
não comprometer o resultado dos nossos trabalhos - e reforçou os
"nossos" o que pôs Margarida desconfortável, já que não tinha
intenções de ter nada em comum com aquele parvo convencido.
- E agora que me
"apanhou" desprevenida, e já percebeu que não tenho paciência nem
tempo para rodeios, quer ser homenzinho e explicar quem é de facto e o que
pretende fazer comigo? - aquilo tinha soado mal, mas a essência estava lá, e
ele não parecia burro, nem corajoso o suficiente para fazer trocadilhos idiotas
com as suas palavras, pelo menos não naquele momento, em que estava
visivelmente colérica.
Nuno obedeceu,
- Sou inspetor da polícia
judiciária e luto com um caso que, tenho que admitir, me transcende, e irá
enlouquecer se não solucionar! Para além de que sou pago para prender mauzões,
e este em particular, parece não existir - confessou descontraidamente, o que a
fez mais uma vez questionar-se sobre as suas capacidades de análise, afinal o
parvo poderia não ser parvo de todo. -
Mas antes de acrescentar seja o que for às informações específicas deste caso,
preciso de saber se posso contar com a sua ajuda. - e recostou-se na cadeira
que parecia bem mais pequena que o normal com aqueles noventa e muitos quilos
de músculos.
Margarida deixou o silêncio
alongar-se mais do que o aceitável, e percebeu que o seu novo amiguinho começava
a ficar desconfortável. Não lhe olhava diretamente nos olhos para não se
desconcentrar, havia neles qualquer coisa de demasiado profunda e que a
incomodava, mas analisava pacientemente todas as suas reações faciais numa tentativa
de o deixar enervado. Não poderia nunca dar uma resposta daquelas no momento,
primeiro porque estava demasiado chateada com as graçolas feitas às suas
custas, e depois porque simplesmente ela não funcionava assim.
(direitos reservados, afsr)
(imagem, internet)
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