quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

"Margarida, o Bom e o Mau Gigante", Capítulo 2, 1ª parte






Capítulo II


Depois da conversa com a Diretora da empresa, Margarida tinha envelhecido alguns anos, e embora fosse livre para não colaborar naquele plano que lhe parecia imbecil, a sua curiosidade macabra iria vencer, e sabia que a aguardavam noites angustiantes de insónias assim que aceitasse trabalhar com o "Tó Nuno"! Apelidara assim secretamente o polícia, depois de ter sido comparada por este com uma miúda de 15 anos. Era o seu lado vingativo a deitar as unhas de fora.
Decidiu tirar o resto do dia para deprimir longe do local do crime, e pela primeira vez em muitos anos, não ficou com remorsos por deixar toneladas de trabalho em cima da secretária. Mas antes de sair ainda precisava de fazer algo muito importante que não poderia esperar pelo dia seguinte, voltou à secretária, agarrou no manuscrito perfumado e lançou-o violentamente para o caixote do lixo, materializando a sua frustração.

Conduziu vagarosamente até ao único local onde lhe apetecia estar naquele momento, a casa da mãe. Desejou que esta adivinhasse a sua iminente chegada e tivesse cozinhado um dos seus pratos favoritos, necessitava de comer urgentemente e não seria uma sandes que a iria consolar.

Isabel ficou espantada com aquela visita surpresa a meio de um dia de trabalho. A aparência da filha deixou-a um pouco chocada, fazendo-a reviver por momentos a ansiedade e impotência perante uma adolescente inconformada e solitária, mas como qualquer mãe galinha, ficou feliz por poder enfardá-la com comida caseira.
Margarida era filha única, e a mãe o seu único familiar vivo. Durante toda a infância tinha suplicado para os pais lhe darem irmãos, mas só na juventude lhe fora explicado que a mãe não poderia ter mais filhos, e ela era um milagre, pois contrariara todas as certezas dos médicos ao nascer. Esta inevitabilidade do destino fez dela uma criança solitária, obrigada a adaptar-se ao comportamento adulto, passando horas sentada em frente ao pai, cada um com o seu livro, perdidos nos seus pensamentos. Quando Dinis inesperadamente morreu, Margarida tinha dezasseis anos, ficando apenas com a mãe e os grandes clássicos espalhados na mesa de centro da sala de estar, que seriam o seu refúgio nos anos seguintes, e um consolo emocional que a manteria ligada à memória do pai. 

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(imagem, internet)

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