sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

"Margarida, o Bom e o Mau Gigante" - Capítulo 1, 4ª parte


- Tomás, um seu criado! - respondeu ele de forma teatral e irritantemente divertida, dando-lhe a impressão de que este sabia o quanto os salamaleques a enervavam.
- Li com muita atenção o seu manuscrito - mentiu Margarida ao se sentar rígida na cadeira - e quero que me explique, resumidamente, o que o levou a escrever, e o que espera atingir com este trabalho - esta merda que nem penses que vou ler, concluiu ela mentalmente.
- Leu? - perguntou ele surpreso, ficando calado à espera de uma resposta.
Ali era ela quem fazia as perguntas, eles respondiam e espalhavam-se ao comprido perante o olhar fixo da megera.
- Está a brincar comigo? - vociferou quase descontrolada - Já lhe disse que li, e agora responda às minhas perguntas que não tenho a existência toda para o entrevistar! - estava gradualmente a perder a paciência e teria de fumar outro cigarro se o homem não colaborasse.
- Desculpe, mas não posso deixar de ficar indignado com a facilidade com que uma profissional do seu gabarito mente - explicou, semicerrando os olhos num tom provocador que a fez corar - mas assim vamos diretos ao assunto que realmente me trouxe cá, e esclarecemos tudo. – concluiu, calmamente.
Abençoou o facto de ter abusado na maquilhagem e de ele parecer não ter notado que se sentia envergonhada com aquela exposição crua da sua mentira, mas a experiência que adquirira naquele tipo de entrevistas era grande, e teria de encontrar uma forma elegante de sair vitoriosa.
- Como deve compreender, - começou Margarida a explicar - na minha profissão aparecem diariamente dezenas de candidatos ao prémio Nobel da literatura, só que, surpreendentemente, a maioria não sabe sequer escrever o nome, quanto mais expor ideias no papel! Confesso que li duas páginas apenas. Para a minha análise, chega!- disse num tom irónico. Ficou pouco convencida dos seus argumentos, e teve a certeza de que não estava nos seus melhores dias quando Tomás a fitou silenciosamente com ar de gozo, de braços cruzados.
- Mais uma vez estou pasmado com a sua capacidade de mentir, mas não posso permitir que se continue a humilhar, já que sou um cavalheiro, e o que me trouxe até si é sério e estamos a desperdiçar tempo precioso nesta conversa, que por muito que me divirta, já devia ter tido lugar há meses, não fosse a sua resistência. - rematou.
Margarida queria saltar por cima da secretária e "esfrangalhar" aquele tipo, e por breves segundos imaginou a cena deliciosa de se ver a esmurrar aquele idiota, e foi com grande esforço que limitou os seus desejos a um:          
- Queira então dar-me o prazer de explicar o que estamos aqui a fazer, e poupe-me aos seus pseudo enigmas, senhor Tomás. A sua entrevista já demorou mais do que devia. - terminou de forma conclusiva e direta.

Ele endireitou-se na cadeira e modificou a postura, sendo possível a Margarida perceber que a brincadeira tinha terminado, e sim, aquele homem não era oco. Havia qualquer coisa naquela cena que não batia certo, Tomás não era nome de macho.

(direitos reservados, afsr)

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