As
mãos suavam-lhe, sentia-se dormente e com a respiração alterada. Que porcaria, lamentava-se, ciente de
que não conseguiria resistir se João lhe tocasse. Ele tinha uma força
energética muito grande, como um íman gigante, e para além disso era muito
bonito. Que mulher podia negar um convite daqueles feito por um Super Íman
Borracho? Uma lésbica, talvez!!,
ralhou consigo mesma. Aí estava o problema. Cairia certamente nos braços dele
em menos de cinco minutos, mas depois, quando recuperassem o tino, teria de se
explicar.
-
Entra. – disse-lhe educadamente, quebrando o silêncio, acendendo as luzes e
fechando a porta devagar depois de ela passar e evitar tocar-lhe, o que o
intrigou.
-
É muito grande. – comentou espantada, distanciando-se dele estrategicamente.
-
Sim, às vezes também sinto isso. – confessou, tirando o casaco e observando as
movimentações dela pela sala.
-
Era a tua mulher? – perguntou curiosa ao ver uma foto dele com uma mulher numa
prateleira.
-
Sim, morreu de cancro. – disse com alguma mágoa – Já devia ter tirado daqui, é
tétrico.
-
Não o faças. – aconselhou-o, tocando-lhe afetuosamente no braço que segurava a
moldura. – Tudo faz parte de nós, a alegria, a tristeza, não podes querer
apagar tudo o que viveste de bom com ela. Não é justo.
João
olhava-a incrédulo. Ela tinha razão, tirar dali Isabel seria negar que ela fora
uma parte feliz da sua vida, em tempos. O seu toque sedoso não o deixou matutar
muito mais naquilo, e João poisou a foto para a encarar. Sentia-a também nervosa
e estranha, como se estivesse à espera que ele avançasse, mas não podia ser,
dizia-lhe o seu lado racional.
Marta
esquivou-se, afastando-se no momento certo e disfarçou o embaraço caminhando
pela casa a dentro, sem pedir licença.
-
Então e aqui para dentro? Há vestígios de vida humana ou a tua casa é toda fria
e impessoal?
-
À direita é o meu quarto. – explicou, alcançando-a e acendendo-lhe a luz,
entrando logo a seguir. Estava especialmente bonita, com roupas confortáveis e
a típica saia comprida, mas de um tecido que estranhamente se lhe moldava
perfeitamente, mostrando as curvas bem feitas do seu corpo. – Aí é a casa de
banho. – disse com a garganta seca.
-
Meu Deus… o que é isto? – exclamou horrorizada, ao ver a quantidade de remédios
que João tinha dispostos no armário, num local que indicava que ele os
utilizava com regularidade.
-
Bem… isso é o meu kit de sobrevivência. – confessou envergonhado. – Este é para
dormir, este para acordar, este para ficar bem disposto, e este, bem, este é
para SOS. – enumerou apontado cada um deles, sentindo-se mais leve com a
confissão, e puxando-a para fora da casa de banho.
-
Que horror. Não podes estar a falar a sério. – disse-lhe preocupada com a ideia
de que um homem tão novo, bonito, inteligente, precisasse daquilo tudo para se
manter normal. – Comprimidos para SOS… que tipo de SOS?
-
Não te preocupes. Faz parte de um tratamento já longo. Não me apetece falar
sobre isso. – pediu-lhe com um sorriso triste.
-
Eu posso ajudar em alguma coisa? – perguntou-lhe genuinamente interessada na recuperação
de fosse o que fosse que o punha doente.
-
Já estás a ajudar. – confessou, colocando-lhe uma madeixa de cabelo atrás da
orelha.
-
Acho que sei como evitares hoje o comprimido para dormir. – disse-lhe animada,
empurrando-o para cima da cama. – Vou dar-te uma massagem especial. – explicou
decidida, procurando na casa de banho por creme ou um óleo qualquer. –
Despe-te. Quer dizer, tira tudo menos os boxers, claro. – corrigiu.
-
Não queres antes treinar aqui umas técnicas do teu livro? – gracejou, tentando
descontrair-se enquanto se despia desconfortável.
-
Ainda não estás preparado para isso. – respondeu sorrindo-lhe e fazendo-lhe
sinal para que se virasse de barriga para baixo.
-
Isso quer dizer que há esperança? – perguntou espantado.
-
Cala-te e fecha os olhos. – colocou-se sentada por cima dele, admirando aquela
visão que poderia ter, se quisesse, e aproveitando essa sensação de prazer
mental, aquecendo as mãos uma na outra. – Agora relaxa e não penses em nada.
-
Desculpa, mas com uma mulher em cima de mim isso é um bocado difícil… -
confessou sorrindo contra o colchão.
-
Liberta-te e concentra-te só no meu toque. À medida que fores sentindo a
massagem, vais visualizando essa zona do corpo a descontrair. – sussurrou-lhe
quase encostada ao corpo dele.
-
Estás a castigar-me porque eu não gosto do teu elefante manhoso? – gracejou a
sentir-se a explodir, como iria adormecer com aquilo era um absoluto mistério.
Marta
sorriu satisfeita e iniciou a massagem vigorosa e experiente, sentindo-o a
ceder aos estímulos certos, ouvindo a sua respiração a acalmar-se ritmicamente.
À medida que o amolecia sentia-se cada vez mais inquieta e nervosa. Era tão
fácil estar com ele e parecia-lhe tão certo, que a assustava. João estava quase
no ponto, admirava-o, tão obediente e manso, crente de que ela realmente o
conseguiria ajudar. Sabia que aquela disposição era provocada pelo facto de ele
achar que não a atraía, o que era a maior das mentiras. Foi deslizando até aos
pés, saindo suavemente da posição inicial e preparando-se para o final daquela
noite tão inusitada. Pegou-lhe no pé e premiu o “botão do sono”, colocando-o
num estado de inconsciência bem parecido com aquele que se tinha a dormir.
Tapou-o e beijou-lhe a cara com devoção. Marta 1, comprimidos 0!, pensou
orgulhosa, saindo e desligando as luzes todas até à porta da rua.
(direitos reservados, afsr)
(imagem, internet)
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