terça-feira, 24 de abril de 2018

"A Mala Vermelha" - Cap 6 (1ª parte)


            


As mãos suavam-lhe, sentia-se dormente e com a respiração alterada. Que porcaria, lamentava-se, ciente de que não conseguiria resistir se João lhe tocasse. Ele tinha uma força energética muito grande, como um íman gigante, e para além disso era muito bonito. Que mulher podia negar um convite daqueles feito por um Super Íman Borracho? Uma lésbica, talvez!!, ralhou consigo mesma. Aí estava o problema. Cairia certamente nos braços dele em menos de cinco minutos, mas depois, quando recuperassem o tino, teria de se explicar.
            - Entra. – disse-lhe educadamente, quebrando o silêncio, acendendo as luzes e fechando a porta devagar depois de ela passar e evitar tocar-lhe, o que o intrigou.
            - É muito grande. – comentou espantada, distanciando-se dele estrategicamente.
            - Sim, às vezes também sinto isso. – confessou, tirando o casaco e observando as movimentações dela pela sala.
            - Era a tua mulher? – perguntou curiosa ao ver uma foto dele com uma mulher numa prateleira.
            - Sim, morreu de cancro. – disse com alguma mágoa – Já devia ter tirado daqui, é tétrico.
            - Não o faças. – aconselhou-o, tocando-lhe afetuosamente no braço que segurava a moldura. – Tudo faz parte de nós, a alegria, a tristeza, não podes querer apagar tudo o que viveste de bom com ela. Não é justo.
            João olhava-a incrédulo. Ela tinha razão, tirar dali Isabel seria negar que ela fora uma parte feliz da sua vida, em tempos. O seu toque sedoso não o deixou matutar muito mais naquilo, e João poisou a foto para a encarar. Sentia-a também nervosa e estranha, como se estivesse à espera que ele avançasse, mas não podia ser, dizia-lhe o seu lado racional.
            Marta esquivou-se, afastando-se no momento certo e disfarçou o embaraço caminhando pela casa a dentro, sem pedir licença.
            - Então e aqui para dentro? Há vestígios de vida humana ou a tua casa é toda fria e impessoal?
            - À direita é o meu quarto. – explicou, alcançando-a e acendendo-lhe a luz, entrando logo a seguir. Estava especialmente bonita, com roupas confortáveis e a típica saia comprida, mas de um tecido que estranhamente se lhe moldava perfeitamente, mostrando as curvas bem feitas do seu corpo. – Aí é a casa de banho. – disse com a garganta seca.
            - Meu Deus… o que é isto? – exclamou horrorizada, ao ver a quantidade de remédios que João tinha dispostos no armário, num local que indicava que ele os utilizava com regularidade.
            - Bem… isso é o meu kit de sobrevivência. – confessou envergonhado. – Este é para dormir, este para acordar, este para ficar bem disposto, e este, bem, este é para SOS. – enumerou apontado cada um deles, sentindo-se mais leve com a confissão, e puxando-a para fora da casa de banho.
            - Que horror. Não podes estar a falar a sério. – disse-lhe preocupada com a ideia de que um homem tão novo, bonito, inteligente, precisasse daquilo tudo para se manter normal. – Comprimidos para SOS… que tipo de SOS?
            - Não te preocupes. Faz parte de um tratamento já longo. Não me apetece falar sobre isso. – pediu-lhe com um sorriso triste.
            - Eu posso ajudar em alguma coisa? – perguntou-lhe genuinamente interessada na recuperação de fosse o que fosse que o punha doente.
            - Já estás a ajudar. – confessou, colocando-lhe uma madeixa de cabelo atrás da orelha.
            - Acho que sei como evitares hoje o comprimido para dormir. – disse-lhe animada, empurrando-o para cima da cama. – Vou dar-te uma massagem especial. – explicou decidida, procurando na casa de banho por creme ou um óleo qualquer. – Despe-te. Quer dizer, tira tudo menos os boxers, claro. – corrigiu.
            - Não queres antes treinar aqui umas técnicas do teu livro? – gracejou, tentando descontrair-se enquanto se despia desconfortável.
            - Ainda não estás preparado para isso. – respondeu sorrindo-lhe e fazendo-lhe sinal para que se virasse de barriga para baixo.
            - Isso quer dizer que há esperança? – perguntou espantado.
            - Cala-te e fecha os olhos. – colocou-se sentada por cima dele, admirando aquela visão que poderia ter, se quisesse, e aproveitando essa sensação de prazer mental, aquecendo as mãos uma na outra. – Agora relaxa e não penses em nada.
            - Desculpa, mas com uma mulher em cima de mim isso é um bocado difícil… - confessou sorrindo contra o colchão.
            - Liberta-te e concentra-te só no meu toque. À medida que fores sentindo a massagem, vais visualizando essa zona do corpo a descontrair. – sussurrou-lhe quase encostada ao corpo dele.
            - Estás a castigar-me porque eu não gosto do teu elefante manhoso? – gracejou a sentir-se a explodir, como iria adormecer com aquilo era um absoluto mistério.
            Marta sorriu satisfeita e iniciou a massagem vigorosa e experiente, sentindo-o a ceder aos estímulos certos, ouvindo a sua respiração a acalmar-se ritmicamente. À medida que o amolecia sentia-se cada vez mais inquieta e nervosa. Era tão fácil estar com ele e parecia-lhe tão certo, que a assustava. João estava quase no ponto, admirava-o, tão obediente e manso, crente de que ela realmente o conseguiria ajudar. Sabia que aquela disposição era provocada pelo facto de ele achar que não a atraía, o que era a maior das mentiras. Foi deslizando até aos pés, saindo suavemente da posição inicial e preparando-se para o final daquela noite tão inusitada. Pegou-lhe no pé e premiu o “botão do sono”, colocando-o num estado de inconsciência bem parecido com aquele que se tinha a dormir. Tapou-o e beijou-lhe a cara com devoção. Marta 1, comprimidos 0!, pensou orgulhosa, saindo e desligando as luzes todas até à porta da rua.




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