segunda-feira, 26 de novembro de 2018

"A Mala Vermelha" - Cap 23 (4ª parte)




César correu até à urgência da clínica, desesperado por saber o que se passava agora. Ligaram-lhe para o gabinete dizendo que o seu paciente 5 estrelas tornava a entrar nas urgências, mas desta vez com traumatismos vários. Ainda ficava ali estendido um dia, com um enfarte, se o João não parasse de o surpreender, lamentou-se, arfando pesadamente no seu débil passo de corrida. Tinha de se exercitar, decidiu frustrado. Procurou pelo amigo e foi encontrá-lo sentado numa maca, de tronco nu e faixas enroladas a pressionarem as costelas. Mas que raio teria acontecido naquelas poucas horas em que tinha deixado a casa dele?
- Então, o que se passou? Estás bem?
- Andei à porrada. - esclareceu, fazendo um esgar de dor ao tentar levantar-se.
- À porrada?? - exclamou, ajudando-o a erguer-se. - Mas alguém te atacou?
- O Janota foi lá a casa assim que saíste, detesto aquele gajo. - gemeu, aceitando a ajuda do médico para vestir a camisola.
- Aquele segurança enorme? Tu estás mais doido do que eu imaginei. - ralhou paternalmente. - Mas porque é que se chatearam a este ponto? - fez uma careta de preocupação ao ver os hematomas na cara de João a testemunhar a tareia que este tinha levado.
- Ele não gostou do que ouviu. Foi para lá dizer-me que amava a Marta e eu fui o culpado de ela o ter deixado. - bufou, a recomeçar a sentir a raiva a crescer.
- Quando uma pessoa pensa que já viu tudo, os quarentões decidem lutar por uma miúda... - gozou, achando piada à ideia de ver dois homens adultos engalfinhados por causa do amor. Ajudou-o a calçar-se e deu-lhe uma palmadinha leve nas costas, apoiando-o na sua dor.
- César, um homem é um homem. E não é por ele ter 100 kilos de força que pensa que me vou ficar a ouvi-lo falar dela. Ai... - gemeu, apoiando-se no médico enquanto caminhavam para fora do gabinete – Acreditas que a Isabel não me veio trazer? Deixou-me vir sozinho a conduzir até aqui. - lamentou-se.
- Tu és mesmo inocente, ou parvo. Andas à porrada com um homem por causa de outra mulher e queres que a tua namorada te traga ao hospital? Aí estou com ela. - gozou, mesmo não suportando a tipa, era óbvio que tinha razão. Mas também era bem feito para ela, devia ser humilhante saber que o homem com quem vive ama outra pessoa. - Queres que te leve a casa?
- Não. Tenho o carro no estacionamento. Mas obrigado. - Deu-lhe um aperto de mão e respirou fundo caminhando dificilmente até ao carro. Ainda queria passar em casa dela, confirmar que estava mesmo abandonada, matar um pouco as saudades daquele momento que tiveram. Sempre que a recordava, de roupão e chinelos, fechava os olhos e revivia aquele abraço por dentro da roupa, a sensação maravilhosa de sentir o seu corpo junto do seu. Imaginava como seria pele com pele, sedosa, aquele perfume simples do seu cabelo. Era uma tortura doce, que o consolava sempre que se sentia mais desesperado, sozinho naquele quarto de hóspedes para onde tinha fugido.

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(imagem, internet)

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