sexta-feira, 14 de abril de 2017

"Margarida, o Bom e o Mau Gigante" - Cap 11 (1ª parte)



Margarida acordou uma hora mais cedo que o habitual, cheia de olheiras, e com um aspeto miserável.
Tinha tido bastante tempo durante a noite para, no meio das crises de choro e de fúrias, engendrar um plano de salvamento para o dia seguinte.
Ela suportava muita coisa, engolira o orgulho na noite anterior com a atitude agressiva e destemperada de Nuno, porque sabia que era o medo a falar, mas batom, não. NÃO!!! Berrava ela enraivecida na almofada. Queria partir o quarto todo, esfrangalhar a porca que se tinha esfregado nele, arrancar-lhe os olhos e pisar os restos mortais!
Deixou-se consumir pelo ódio dos ciúmes durante várias horas e quando conseguiu ficar mais calma, decidiu que sairia de casa antes dele, sozinha. Sabia que estaria a colocar-se em perigo, ainda havia um doido a querer matá-la, mas não conseguia encarar Nuno, estava demasiado magoada.
Tudo menos batom…

Arranjou-se em silêncio absoluto, escolhendo uma saia demasiado curta para uma mulher comprometida, pensava recriminando-se, mas que iria ajudá-la a sentir-se menos inferior junto de Nuno. Ele iria procura-la na editora, e devia ficar chateado quando a visse a mostrar mais do que devia à empresa toda. Tinha de o castigar, remoía ela. Ou talvez já não se importasse… lamentava ela sentindo a garganta secar. Sempre havia a hipótese de ele não a amar como lhe dissera no dia anterior depois do jantar, os olhos ameaçaram inundar-se e Margarida respirou fundo. Fosse qual fosse a explicação para a traição de Nuno, ela teria de lidar com isso de forma superior. Ah, e mudar-se para casa da mãe, lembrou-se angustiada.

Tal como previra, a sua entrada na empresa animara a maioria dos homens. Sexy e de óculos escuros, Margarida escondia a frágil rapariga destroçada, passando decidida pelos corredores, onde todos os olhares se voltavam para ela.
Abriu a porta da sua sala, entrou, fechou a porta e apercebeu-se de que vinha em apneia há demasiado tempo. Teve uma tontura provocada pela falta de oxigénio, ou por não ter conseguido comer nada, e procurou apoio na secretária, para evitar uma queda aparatosa. Respirava calmamente, recuperando os sentidos, quando Catarina entrou no escritório, sem pedir licença, e a viu naquela posição que sugeria algum mau estar.
Afinal ela tinha visto o batom, pensou triunfante. - Ó querida, eu peço desculpa, não queria que ficasses assim, - escarneceu Catarina miando – deverias ter sabido de tudo de outra forma.. – tentando não sorrir e manter um ar arrependido.
- Ham? Mas do que é que estás a falar? – Margarida não tinha paciência para aquela parva logo de manhã, e num dia difícil como aquele. – Senti-me tonta, apenas, mas está tudo bem, obrigada.
Recompôs-se e dirigiu-se à secretária para começar o trabalho. Desde o ataque de Álvaro que Nuno retirara toda a investigação da sua sala e Margarida assumira novamente o seu trabalho de editora, remetendo Catarina para a função de paquete/assessora de edição, o que tinha deixado a funcionária furiosa.
- Que olheiras horríveis! – guinchou Catarina assim que Margarida retirou os óculos – Eu disse ao Nuno que ele devia ia com calma. – lançou ela em desafio declarado.
- Tu disseste o quê, a Quem? – Margarida esperava ter ouvido mal, segurou-se na mesa antes de ceder ao impulso de a espancar, podia ser tudo um mal-entendido.
Catarina sentou-se, corajosa, mostrando que não iria fugir e que estava decidida a enfrentá-la, o que aumentou a raiva da “chefe”. Mas o prémio daquele confronto era um homem de 1,90m, musculado, atraente e que já pertencera a Margarida, pensou vingativa.
- Ontem o Nuno telefonou-me à noite, estava chateado e queria conversar, – iniciou ela sentindo-se poderosa.
Margarida ouvia aquelas palavras com zumbidos fortes dentro da cabeça, como se o cérebro reagisse repulsivamente às confissões de Catarina.
 – e fomos beber uma cerveja. Ele levou-me a casa, e aconteceu. Desculpa. – tinha saído melhor do que ela pensara, ensaiara um discurso mais longo, mas Margarida reagia bem ao resumo que inventara ali à pressão, pensou.
- Saia imediatamente da minha sala! – gritou com as forças que tinha no momento.
Margarida lutava internamente para não a matar, ali mesmo. Não conseguia raciocinar e começava a ver tudo vermelho, iria magoá-la se ela não desaparecesse da sua frente.
- Desculpa, não é nada contigo, ele é que deixou de gostar de ti. – E levantou-se calmamente, mantendo a voz submissa e fingida.

Margarida viu-a sair da sala e fechar a porta em fragmentos de lucidez, como se a realidade estivesse a combater a loucura. A garganta começava a fechar, sem controlo, e procurou a bomba de asma freneticamente, sentindo picadas no peito. Entrou em pânico quando se apercebeu que não trouxera a bomba com ela, caindo de joelhos. Iria morrer, e Catarina ficaria feliz abraçada ao seu gigante, ouvia o seu demoniozinho interior gritar. 

(direitos reservados, afsr)
(imagem, internet)

Sem comentários:

Enviar um comentário