quinta-feira, 4 de outubro de 2018

"A Mala Vermelha" - Cap 16 (4ª parte)




Entraram em casa de João e Isabel mostrou-lhes os quartos que poderiam ocupar naquela noite, pedindo licença para se ir deitar. Sentia-se morta por dentro, como se estivesse a ser presa por dois ou três cordéis invisíveis, comandados por outra pessoa qualquer. Fechou a porta do quarto, trancando-a de seguida e despiu-se, entrando no duche. Manteve-se vários minutos debaixo do chuveiro intenso, de olhos fechados, apoiando-se com uma das mãos na parede por sentir as pernas bambas meio adormecidas. Sabia que estava no limite das suas forças, terminou o duche e apressou-se a sair da cabine que lhe trazia cada vez mais recordações daquela manhã. Como podia a sua vida ser tão cínica e cruel, perguntava-se, lembrando-se do corpo dele a comprimi-la contra a parede, as suas mãos grandes a explorá-la sem pudores, a sua boca exigente e sensual. Quebrou nesse momento, deixando-se cair no chão, agarrada aos joelhos, chorando descontrolada. A imagem dele numa cama de hospital, adormecido pelas drogas, em letargia, consumia-a, estrangulando-lhe a garganta. Foi surpreendida pelo som do telemóvel, poisado na cama que interrompeu a sua crise de choro, obrigando-a a voltar à realidade. Embrulhou-se na toalha, apressou-se a chegar até ao aparelho, pegando-lhe com as mãos trémulas. Uma breve esperança de que fosse algum contacto dele surgia-lhe no coração, insuflando-o. Abriu a mensagem do número desconhecido e não conseguiu travar um grito histérico, largando o telefone como se esse queimasse. Caiu no chão de joelhos, sem parar de gritar, e arrastou-se até à porta, abrindo-a para fugir do espaço fechado que a começava a sufocar. Janota e Salvador apareceram no mesmo instante, sobressaltados, procurando pelo motivo dos gritos.
- Isabel! O que foi? – Salvador ajoelhou-se na sua frente, segurando-a.
- O Filipe… ele vai-lhe fazer o mesmo… - soluçou descontrolada, tentando soltar-se dos braços que a ajudavam.
Janota pegou no telemóvel, viu a foto do cão esventrado, e a legenda que se seguia: “Este já está. O teu namorado é o próximo”. – Eu vou matar este gajo… - rosnou, apagando a mensagem automaticamente.
Salvador pegou em Isabel que se debatia, colocando-a com dificuldade na cama.
- Calma Isabel, por favor tem calma. Ninguém vai fazer aquilo ao João. Nós prometemos-te. Janota, agarra-a, vou ver se o João aqui tem algum calmante. – deixou-os e vasculhou a casa de banho do amigo, encontrando um remédio que seria eficaz para acalmarem Isabel, voltando logo de seguida para o quarto. – Toma este comprimido. Vais sentir-te melhor… - pediu, sabendo que teria de a forçar a engolir o remédio. – Vamos, abre a boca, por favor. Janota, abre-lhe a boca. – ordenou.
- Achas mesmo necessário isto? – perguntou incomodado com aquelas manobras violentas numa mulher frágil.
- Ela está em crise de nervos, não vês? Não se vai acalmar por si só. Vamos, abre-lhe a boca! – disse já a perder a paciência.
- Isabel, desculpa, mas é para teu bem. – Janota obedeceu ao amigo e colocaram-lhe o comprimido à força no fundo da garganta, deitando-lhe depois um pouco de água na boca aberta pelas mãos do segurança, que tentava não a magoar.
Mantiveram-se com ela enquanto o corpo esperava pelo efeito do remédio, e repentinamente Isabel adormeceu, amolecendo automaticamente, caída na cama. Salvador e Janota respiraram fundo e deixaram-na coberta, com a toalha ainda em volta do seu corpo, por pudor em coloca-la mais confortável. Saíram, deixando a porta aberta por precaução, não fosse ela acordar durante a noite e precisar de ajuda.
- Que dia… - suspirou Salvador, sentando-se derrotado no sofá – Vê se ele aí tem alguma coisa forte que se beba, por favor… Acho que preciso de anestesiar a cabeça…
- Whisky? – perguntou Janota, espreitando o bar sofisticado da sala.
- Serve, tem de servir…

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(imagem, internet)

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