- Bem, meninos, vamos lá deixar a
doentinha descansar, por hoje já chega de visitas e eu sou bastante ciumento. –
Nuno conseguia sempre desanuviar um ambiente, com o seu espírito alegre e
positivo. - A enfermeira chefe esteve lá fora a dizer-nos que tens alta daqui a
dois dias, só por precaução, está tudo bem contigo. – e sentou-se novamente no
seu local de vigia, dando a entender que não ia sair da beira da sua cama de
hospital.
Sofia ficou amuada por ter de ir dormir
para casa dos tio s, mas Ana rejubilou com o regresso da
sobrinha, mesmo que só por uns dias. Sofia vivia com o tio apenas há cinco
anos. Nuno tinha feito questão de a trazer de casa da Ana e do Jorge, onde fora acolhida
em bebé quando os pais morreram, mas a criança era muito agarrada a ele e parecia só estar relaxada quando este
estava por perto. Ana ficara abalada com a saída dela de sua casa, mas
compreendeu que talvez fosse bom para os dois ficarem juntos, afinal tinham
muito em comum.
A comitiva familiar despediu-se dos dois,
e Isabel descansou a filha garantindo que já tinha trocado a fechadura de casa
e que não iria ser descuidada, mantendo-se alerta para alguma visita
inesperada. Desta vez não abriria as portas de sua casa a ninguém e Jorge já
tinha organizado uma vigilância permanente à sua rua até tudo aquilo acalmar.
Margarida percebeu que Álvaro tinha escapado, mas fingiu não ter entendido.
Nuno acompanhou todos à porta do quarto e
teve de empurrar os gémeos à força para que estes seguissem os pais, o
entusiasmo dos adolescentes com os acontecimentos macabros era despropositado
para o inspetor.
- Estes vão seguir as pisadas da família,
só gostam de sangue… - gracejou Nuno, voltando para junto de Margarida. O
gigante parecia mais velho, abatido, e Margarida, que já tinha preparado um rol
de perguntas para lhe fazer assim que ficassem sozinhos, retraiu-se, com medo
de o amargurar mais. Não conseguia imaginar o que aquele homem tinha passado, o
desespero de não saber se a ia encontrar, viva ou morta. Já tinha perdido tanta
gente, ficara órfão aos cinco anos, sem uma irmã e um cunhado aos vinte e um…
era demasiada morte e tristeza para uma pessoa tão nova. – constatava Margarida
nos seus pensamentos.
- Não tens de ficar aqui comigo de noite,
Nuno. Vais dormir todo torto. – disse ela genuinamente preocupada com o facto
de ele parecer não ter dormido na noite anterior.
- A Menina acha que a vou deixar sozinha?
E se precisar de ir à casa de banho ou que lhe ajeitem a almofada? – gracejou
ele.
Margarida retesou-se novamente com aquela
expressão, que lhe provocou calafrios.
- O que se passa? Tens dores? – questio nou preocupado.
Havia algo de muito errado na forma como
ele e o homem que a atacara falavam… as lágrimas invadiram-lhe as palavras, não
conseguia verbalizar. Margarida tinha uma suspeita angustiante na cabeça, que
não lhe saía do pensamento desde que o ouvira falar a primeira vez, ao acordar
no hospital.
- Não penses mais nele, por favor. Esse
assunto vai ser arrumado, mais cedo ou mais tarde. Eu prometo-te. – Nuno
beijou-a com delicadeza, tentando não acertar nas zonas magoadas da cara dela.
Olhou angustiado as marcas das agressões que Álvaro tinha deixado na mulher que
amava e profetizou,
-
Ele vai pagar por tudo isto, por cada centímetro do teu rosto. – Margarida não
tinha noção do estado em que estava, nem do seu aspeto, e temia olhar o
espelho. Sabia que tinha levado pontos e sentia hematomas, mas o importante era
estar viva, e principalmente, tê-lo ali.
- Não quero que faças nada precipitado,
por favor. – pediu Margarida. – Precisamos de investigar um pouco mais, antes
de tomares uma atitude. Garante-me que não vais atrás dele. - suplicou.
- Não te quero mais envolvida nesta
história, já chega de brincares aos polícias. Só Deus sabe o que me culpo
quando te vejo aqui neste estado, no que podia ter acontecido… - Nuno
revolvia-se com remorsos – Esse gajo agora é problema meu. – concluiu.
Margarida não podia revelar o que
suspeitava, era terrível demais. Sossegou Nuno e guardou para si mesma os
pensamentos que a invadiam.
- Então e agora? Se ficar feia e
deformada, ainda me vais querer? – brincou ela, mudando de assunto.
- Sempre fico com o teu rabo delicioso
para apalpar! – Nuno sentou-se na cama, recostou-se colocando uma almofada na
cabeça, esticou as pernas ao lado das dela, e Margarida encostou-se no seu
tronco, como dormira na segunda noite em que o conhecera.
-
Vais ficar? – perguntou ela, sentindo-se a ceder ao sono.
-
Sim, não te preocupes. – garantiu ele, beijando-lhe a cabeça.
-
Ainda bem. – Abraçou o seu gigante, e adormeceu.
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(imagem, internet)
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